quarta-feira, 14 de julho de 2010

14 de julho - 221 anos da Queda da Bastilha


Há 221 anos o povo parisiense invadiu as ruas da capital francesa e tomou um dos maiores símbolos do absolutismo francês, a Bastilha.

A Bastilha era uma fortaleza medieval utilizada como prisão, local onde o rei trancafiava seus inimigos políticos. Por ser o local onde ficavam presos os inimigos do absolutismo francês, a Bastilha se tornou símbolo deste Regime.

No dia 14 de julho de 1789 o povo apoderou-se de cerca de 30 mil fuzis e alguns canhões e rumou em direção à Bastilha. Em poucas horas a Bastilha foi tomada pelos populares. Ao Rei restou duas alternativas: render-se ante a força das massas ou iniciar uma guerra nas ruas de Paris. Optou pela capitulação.

Este evento marcou a Revolução Francesa e se transformou em um dos maiores símbolos das revoluções burguesas.

O imortal Waldimir Maia Leite (RIP), em Opinião no Diario de Pernambuco, escreveu em julho do ano passado: “O 14 de Julho não é data construtiva e emocional apenas da França e dos franceses. É data mundial de grande efeméride. (...)14 de Julho - uma data não só dos franceses, mas do mundo todo...”.

Sem dúvida a Revolução Francesa significa muito não apenas para os franceses, como para todos os povos do mundo. Ela foi a revolução de maior impacto e repercussão. Além disso, ela foi uma verdadeira “revolução social de massa” (Hobsbawm). Representou um exemplo que inspirou outros povos, como os latino-americanos que lutaram por sua independência a partir de 1808.

A Revolução Francesa não foi fruto de um partido ou apenas um movimento organizado, ela refletiu o consenso de idéias da burguesia, o que permitiu ao movimento revolucionário uma unidade efetiva. Estas idéias, formuladas pelos filósofos, eram as do liberalismo clássico.

Um dos legados da Revolução Francesa que se tornou um marco para todos os países, foi a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789.

Os direitos fundamentais do homem têm sua consagração normativa com a promulgação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, na França, em 26/08/1789. Eric Hobsbawm a definiu como “um manifesto contra a sociedade hierárquica de privilégios nobres”, ou seja, a garantia da liberdade do indivíduo perante o Estado, a limitação e o controle do poder do Estado.

Entretanto, embora reconhecendo o fundamental valor da Revolução Francesa e, principalmente, o marco significativo da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, é impossível não analisar esta passagem da história da humanidade com um olhar um pouco mais crítico.

É indiscutível que, com a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, fundou-se uma nova perspectiva, base do Estado moderno, apoiada em uma relação diferente entre o Estado e o cidadão, na qual passou a haver um limite aos abusos de poder do Estado, através de novas formas de controle do poder estatal.

Contudo, chegamos a algumas indagações:

A quem serviu esta nova perspectiva? A quais interesses respondia essa nova base de Estado, essa diferente relação entre o Estado e o cidadão? Quem se beneficiou desta “radical inversão de perspectiva” (Bobbio)?

Foi o povo, a massa social que tomou a Bastilha, o grande beneficiado desta mudança histórica?

O povo tomou a bastilha. A burguesia chegou ao poder.

Hobsbawm definiu a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão como “um manifesto contra a sociedade hierárquica de privilégios nobres”, porém, o próprio autor complementa a sua afirmação e diz “mas não um manifesto a favor de uma sociedade democrática e igualitária”. Ou seja, pregar a liberdade, não significava, obrigatoriamente, a defesa da democracia e de uma sociedade verdadeiramente igualitária.

Os burgueses, ou melhor, os liberais clássicos, não estavam preocupados com a democracia ou com uma sociedade igualitária. O que os motivava era a fundação de um Estado que permitisse a sua ascensão e afirmação social.

Vítimas do Estado absolutista, os burgueses tinham grande preocupação com os limites do poder estatal. Necessitavam, por conseguinte, do estabelecimento de uma nova relação com o Estado.

O burguês liberal clássico era muito mais um constitucionalista do que um democrata. Para os burgueses, era mais interessante uma monarquia constitucional do que uma república democrática. É o que afirma o historiador Eric Hobsbawm:

"[...] O burguês liberal clássico de 1789 (e o liberal de 1789-1848) não era um democrata, mas sim um devoto do constitucionalismo, um Estado secular com liberdades civis e garantias para a empresa privada e um governo de contribuintes e proprietários".

Podemos concluir, portanto, que a burguesia, na persecução da liberdade esteve mais preocupada com a sua liberdade perante o Estado e sua conseqüente ascensão e afirmação social do que propriamente com a democracia e com o povo.

Por fim, reiterando a importância e o significado histórico do 14 de julho de 1789, a ideia que pretendemos passar com esta “visão crítica” é que não podemos jamais confundir “liberalismo” com DEMOCRACIA, afinal um Estado Liberal de Direito nem sempre é sinônimo de Estado Democrático de Direito e a história mostra-nos isso com clareza.

sábado, 10 de julho de 2010

PARA O ADIANTE


Ontem foi a missa de 7º dia do meu avõ.

Posto hoje mais um de seus textos.

Publicado originalmente no livro "Terra Molhada", 1984. Livro que conta com prefácio de Gilberto Freyre.

PARA O ADIANTE

Waldimir Maia Leite (24/12/1925 - 30/06/2010)

Cadeira nº 38 da Academia Pernambucana de Letras

Empurrando sempre para o adiante. Mas tudo voltando, como naquele canto terceiro (O Impossível da Alegoria) do belo poema de Marcus Accioly: “Sísifo”.

Levando para a frente os aconteceres: sempre para o nublado adiante. Virá depois a lembrança do Eclesiastes: “Todas as coisas são difíceis: o homem não as pode explicar com palavras”.

Não ficar: eis uma verdade que dói tão intensamente, e fere, quanto um incontornável gesto de despedida. Impermanência no agora: a necessidade, rubra de tão forte, de ir. Para o adiante que não se conhece, escondido sob a túnica do não ser.

Por que permanecer, se, logo adiante, nascerão os lábios da dúvida? Estes bocados do nada, coisa alguma tão vazia como um corpo de repente sem alma, apenas corpo, estrutura humana e animal.

Os passos ensaiados, adágio ma non tanto, e dolce, como um canto de Bach. Vão os passos para o adiante (a lembrança de um dia morrer, de forma súbita, sem ter conseguido a reconciliação com o que antigamente amou).

(A tarde pondo as mãos nos ombros da noite, como quem, angustiadamente, diz assim: “preciso tanto do teu apoio, mas tanto mesmo que o cansaço me cobre os olhos de inevitável tristeza”).

Empurrando o que não sabe para o adiante. Porém ele teimosamente retornando. Não fica; é prolongamento de ser daqui a pouco. Asperezas de choques de vida, os olhos úmidos de lágrimas, os claros cabelos em desalinho, o desespero de mãos que procuram outras, náufragos ambos na tempestade do existencial.

(Por que esta parte, isolada, separada da outra? Quem operou o brusco corte, com bisturi de fogo?).

Para o adiante, extensão de querer ser, constituir, permanecer. Em vão: de desespero é feito o instante tão rápido que mais parece uma estrela cadente que comete suicídio luminoso para espanto do cosmo.

(Estes dedos, cinco na mão direita, mais cinco na esquerda, duas flores expectantes que se abrem com as pétalas rosas das unhas).

Para o adiante, o inevitável prosseguir, pleno de incertezas, comboio correndo sem maquinista, amargo de ser som afastado do outro lado que a vida, mutuamente, nega. Não ficar, ir até o pedaço maior que compõe o que está por trás das coisas, iceberg das inconstâncias. (Quem duvida que o todo é maior do que uma de suas partes?).

Para o adiante, até um dia a surpresa do explosivo ato final de encher de espanto os olhos rotineiros do mundo.

Para a frente todos os aconteceres: sempre para o adiante. Não ficar, desesperadamente sair com quem se despede para nunca mais.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

O INDIZÍVEL ENDEREÇO


Agora publico aqui um texto do meu avô, um de meus preferidos.

Publicado originalmente no livro "Terra Molhada", 1984. Livro que conta com prefácio de Gilberto Freyre.


O INDIZÍVEL ENDEREÇO

Waldimir Maia Leite (24/12/1925 - 30/06/2010)

Cadeira nº 38 da Academia Pernambucana de Letras

Lá embaixo, o inevitável das sombras, um bocado feito de inconsistentes nadas. Para o além das coisas, a silhueta do que não é, o imperfeito de não aconte(ser).

Vai assim o homem, sem prefácio, obra que jamais será entendida, os capítulos embaralhados, o final indeterminado de ser melancolicamente fim, término, encerrar.

Lembra, então, o homem o quadro de Rembrandt, que viu, certa tarde, no Museu Britânico, em Londres: “As três árvores”. Tela onde predomina mais o escuro. No homem (apenas uma árvore, não as três marcadas pelo pincel de Rembrandt) também prevalecem os escuros.

Vai indo, lentamente como um fechar de pálpebras, prelúdio de adorme(ser). Não sabe até onde vai. Não procurem o homem, ele ignora os próprios passos. Está dividido, uma dor (entretanto amiga e necessária) o acompanha, dia e noite.

O homem junta pedaços do que foi. Para reconstruir-se. Uns sobre outros, trechos de ter sido ligados pela argamassa do Tempo. Põe os olhos numa bandeja de porcelana, como duas uvas. E espera servi-las no festim dos deuses de barro.

A outra parte, distante e, entretanto, tão próxima, mergulhada dentro de águas circunstanciais. Os pés, desnudos, caminham (para onde?). Não sabe. Perdeu as coordenadas. Do homem nada resta: nem o silencia, escondido atrás de uma porta.

Vai indo o homem, cercado dos inevitáveis: isto e aquilo, este e esse, essa e aquela. A multidão de anônimos, seres que sofrem, em surdina, sem direito a protesto, a um grito que possa equivaler a desabafo.

Este instante, crescendo em turbilhão dentro do mar salgado, onde entre vagas flutua o homem. E os instantes anteriores, imprecisos, nostálgicos de terem sido. Lembranças. Apenas lembranças, nada de agoras, tépidos agoras como um ato de tomar uma mão na outra, em ato de construída ternura.

Para o depois, isto: o ser futuro, nascer. Quanto vale a eternidade? O ser eterno e contínuo talvez canse, ser sempre é uma forma de angústia de não acabar.

Para o antes, esta nua conclusão: ter sido e perder a forma primitiva, não ter podido evoluir. Ficar preso a amarras circunstanciais, sem libertar-se do acontecido.

O homem fica debruçado diante dos inevitáveis. Como quem está à janela, entretanto fechada. Olha para o adiante, cheio de incertezas, amargas incompletudes, sabor de fel.

Lentamente, como o fechar de pálpebras, ele interpreta os indícios da noite que se aproxima. Quer o segredo da semente que faz a gestação noturnal. Noite curta, como as de verão, emergente de acabar de ser tarde.

Vai assim o homem, sem prefácio, livro aberto em página onde pulsam as últimas lembranças gravadas em negrito, fortes como permanente saudade, intemporais. O livro marcado por uma folha de jasmim, página nº 112, como um indizível endereço para onde foi remetida mensagem de procura, de saber onde estaria, neste exato momento, o ser que se foi.

Waldimir Maia Leite - Vovô Vadô


Na última quarta-feira, dia 30 de junho, a literatura e o jornalismo pernambucano perderam um grande nome - Waldimir Maia Leite.

Seu corpo padeceu após meses de luta contra um câncer da pelve e, desta forma, ele deu seu último passo "para o adiante", saindo "como quem se despede para nunca mais".

Waldimir Maia Leite era jornalista e escritor. Autor de 4 livros ("Ofício da Busca"; "Terra Molhada"; "O Viajante das Palavras"; "Meio Século na 'Pracinha do Diario'") e um livreto ("Quatro Poemas de Outono"), trabalhou por mais de 50 anos no Diario de Pernambuco. Ocupava a cadeira nº 38 na Academia Pernambucana de Letras.

Waldimir Maia Leite, para mim, era, simplesmente, Vovô Vadô. Meu avô paterno.

Neste seu último ano de vida passamos a ter muito mais contato do que tive em meus primeiros 26 anos de existência.

Era eu quem digitava os seus textos que eram publicados quinzenalmente no Diario de Pernambuco. O último texto foi publicado no dia 22 de março de 2010, quando o tratamento contra o câncer ainda não havia debilitado o seu corpo ao ponto de lhe retirar a enorme capacidade de nos emocionar com suas palavras.

Meu avô completaria 85 anos em dezembro. Ele me dizia que pretendia escrever mais um livro, para celebrar este marco em sua vida. Pediu-me que o ajudasse a escrever o seu quinto livro. Disse-me que o livro seria dedicado a mim, seu neto que tanto o ajudava.

Infelizmente, não foi possível completar estes "passos ensaiados", pois a doença o levou "de forma súbita, sem ter conseguido a reconciliação com o que sempre amou", afinal, "o ser eterno e contínuo talvez canse, ser sempre é uma forma de angústia de não acabar".

Tenho uma certeza, meu avô está "por aí, na orla marítima da praia de Candeias. Perambulando como alguém que procura aquilo que (entretanto) não conseguiu perder".

E, estranhamente, eu o ouço, "como se a sua voz fosse refletida por uma montanha distante", nesses seus "passos em direção ao que há de vir" e "vai assim o homem ... o final indeterminado de ser melancolicamente fim".

Descanse em paz, Vovô Vadô.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Luta Incessante

Segue adiante, em meio à multidão (com a impressão de estar sempre no mesmo lugar).

Tomado pela sensação de um vazio impossível de ser preenchido. Observa todos os transeuntes ao seu redor – homens e mulheres sem faces; máquinas urbanas; escravos de suas circunstâncias.

Mantém o ritmo de passos claudicantes, como quem teme o que está próximo.

Conserva, entretanto, a aparente tranquilidade – a falsa imagem de sobriedade e certeza que todos são forçados a sustentar em suas tarefas diárias.

Trava (internamente) uma batalha incessante, em uma guerra da qual jamais sairá vencedor. Busca pelo desconhecido. Procura razões para os sentimentos mais irracionais. Espera explicações para as sensações mais inexplicáveis.

Tenta (em vão) preencher o vácuo que o toma (quase) por completo. Procura ocupar-se com sua rotina. Melancólica tentativa deste que não tem consciência do que provoca a si mesmo.

Alimenta-se de prazeres fúteis e voláteis. Alimenta-se (sem saber) do vazio que enche o seu interior cada vez mais.

Perfaz-se a cada instante, nesta busca incessante pelo desconhecido.

Decompõem-se, então, em minúsculas partículas. Quem sabe se se recompuser, pedaço a pedaço, não surja um novo ser, renovado e despido de qualquer cicatriz do passado?

Talvez, ao se dividir em pequenos "eus", possa surgir uma nova pessoa. Um outro ser, com a incrível capacidade de esquecer as antigas (e dolorosas) lembranças, que um dia já constituíram, para ele, sentido essencial.

Impossível. Somos o passado e o presente que se tornará o amanhã. Somos aquilo que fazemos ou deixamos de fazer. Lembranças e momentos que se confundem e se misturam. Somos, como disse Noberto Bobbio, aquilo que lembramos.

Trava, então uma luta sem fim. Dia após dia, batalhas de uma guerra impossível de ser vencida.

Uma peleja diária contra si mesmo – seus sonhos, suas limitações, suas frustrações, suas esperanças, seus desesperos.

Uma luta incessante contra aquilo que o constitui essencialmente – as lembranças. O passado que não se apaga; o presente a ser vivido e sentido; o futuro que se apresenta a cada segundo e reflete aquilo que somos, fizemos e lembramos.

terça-feira, 16 de março de 2010

Contando os segundos para te ver

O teu inebriante cheiro permanece no ar. Sinto o teu doce aroma a cada inspiração. Refugio-me em teu aroma encantador, criando um mundo de fantasia(s) nesse processo químico chamado respiração. Mas há algo de diferente. Não troco apenas oxigênio e dióxido de carbono; eu troco esperança e devaneio ao inalar o teu odor sedutor, renovando minhas energias, alimentando-me dos sonhos misturados às lembranças da última vez em que estivemos (fisicamente) juntos.

Olho atentamente para o relógio. Observo fixamente os ponteiros do relógio. É o meu gesto iludido de que posso acelerar a passagem do tempo. A cada vagarosa volta do ponteiro dos segundos eu me desespero. Se os minutos tardam a chegar, como hão de passar as horas?

Quanto tempo mais esperarei para te ver; te ter junto a mim; poder te tocar e abraçar; sentir, enfim, a tua pele sedosa e perfumada encostar-se à minha em um momento de deleite sem igual?

O hoje é tão devagar que tenho a terrível sensação de que o daqui a pouco é, na verdade, um amanhã.

Conto, então, os segundos para te ver. E enquanto o daqui a pouco não se transforma no agora, refugio-me no meu mundo de fantasia(s), movido pelo teu cheiro que mantém o seu fascínio pelo ar...

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

domingo, 20 de dezembro de 2009

FC Porto x Benfica: uma rivalidade que vai além do futebol

Hoje, 20 de dezembro de 2009, enfrentam-se no Estádio da Luz, em Lisboa, Benfica x FC Porto, em jogo válido pela 14ª rodada da Liga Portuguesa 2009/10. Um ponto separa o terceiro colocado dos últimos 4 campeonatos, Benfica, do atual tetracampeão português, FC Porto.

FC Porto e Benfica, são, sem sombra de dúvidas, os dois maiores rivais do futebol português. Nos dias atuais, FC Porto x Benfica representa o maior clássico lusitano e este confronto traz consigo uma história que vai muito além das quatro linhas.

Devido ao jogo de hoje, volto a publicar aqui um texto sobre este grande clássico e esta enorme rivalidade. Desta vez, ao final, acrescento o histórico de confrontos (em todos as competições e apenas na Liga).


FC Porto x Benfica: uma rivalidade que vai além do futebol



Quando entram em campo para disputar aquele que é hoje o maior clássico português, FC Porto e Benfica levam para o gramado muito mais que uma rivalidade entre dois clubes de futebol. Os dois clubes representam duas cidades e duas macrorregiões: Porto x Lisboa; Norte x Sul. Este clássico representa a eterna rivalidade entre as duas maiores cidades portuguesas e cada uma representa a sua região, o Porto muito mais identificado com o Norte do que Lisboa com o Sul, por razões históricas.

Quem olha para Portugal, sem conhecer bem a sua história, pode pensar que se trata de um país igual, que todos os habitantes são parecidos e que existe uma unidade nacional. Talvez por sua dimensão, Portugal passe essa impressão. Porém, desde os tempos mais antigos, Portugal convive com uma divisão fortemente marcada por suas duas grandes cidades, e, atualmente, é no futebol que esta divisão se aflora mais e se manifesta de forma mais acentuada.

A origem de Portugal está no Norte, o Condado Portucalense. Portucale vem de Porto de Cale, a cidade do Porto. Foi do Condado Portucalense que partiu a reconquista dos territórios do Sul, ocupados pelos Mouros (mulçumanos). Lisboa só viria a ser conquistada em 1147, oito anos depois da formação do Reino de Portugal por D. Afonso Henriques e quatro anos após o reconhecimento da independência de Portugal pelo Rei de Leão e Castela, através do Tratado de Zamora.

Durante a ocupação Moura, a cidade de Lisboa se chamava Al-Ushbuna e a maioria de seus habitantes chegou a adotar a língua árabe e a religião mulçumana da minoria invasora que se constituiu como elite. Até hoje, quando alguém do Norte quer provocar os lisboetas, refere-se a estes como os “mouros”.

A partir do reinado de D. Manuel I, quando Portugal começou a se consolidar como Império, viu-se o fortalecimento centralismo português. O poder central se encontrava na capital Lisboa e um Estado absolutista, evidentemente, limitava a autonomia administrativa dos municípios, por conseguinte, Lisboa gozava de uma posição quase que hierárquica sobre as demais cidades portuguesas. O Porto sempre foi o maior expoente do inconformismo.

Chegando ao Século XX , o marco da rivalidade Porto x Lisboa é o Regime Fascista de Salazar. A política autoritária do fascista Antônio de Oliveira Salazar adotou o centralismo econômico e concentrou em Lisboa não apenas o poder político e econômico como também cultural. Salazar, grosso modo, separou Lisboa do resto do país.

No futebol não foi diferente. O "Sistema Político Fascista e Centralista-Salazarista" foi claramente favorável aos clubes de Lisboa, principalmente o Benfica, que era o mais popular. O Regime Fascista se servia das conquistas dos clubes de Lisboa e, especialmente, do Benfica para enaltecer a sua grandeza e se aproveitar da alienação das massas, usando o futebol como um meio de “entretenimento” e um escape à fome e a miséria a que levou o fascismo.

Não é por acaso que o Benfica é conhecido por “encarnados”. O vermelho sempre esteve associado ao comunismo, que, por sua vez, era antagônico ao fascismo. Logo, o Benfica não podia ser referenciado como os “vermelhos”, jamais! Por isso os benfiquistas são “encarnados”.

O FC Porto era o único clube que conseguia, apesar dos pesares, fazer frente aos de Lisboa. Por essa razão, afirmava o mítico José Maria Pedroto que um título do FC Porto valia por dois ou mais do que o de um clube de Lisboa, uma vez que não se competia em igualdade de circunstâncias.

O FC Porto, portanto, assim como a cidade do Porto, tornou-se o foco de resistência, o símbolo do inconformismo, o baluarte do Norte.

Com o fim do Regime Salarazarista, o retorno à democracia e, mais ainda, com a chegada de Jorge Nuno Pinto da Costa à presidência do FC Porto, o futebol português deu uma guinada ao Norte e, pelo menos no futebol, o Porto passou a concentrar o poder e as conquistas.

Como já foi dito, os portistas fazem questão de frisar a influência mulçumana em Lisboa e até hoje se referem aos benfiquistas como “mouros”, em tom pejorativo. Os benfiquistas, por sua vez, fazem referência à outra passagem da história de Portugal, e chamam pejorativamente os portistas de “tripeiros”.

Contudo, enquanto os benfiquistas se ofendem com a referência aos mouros, os portistas se orgulham do termo “tripeiros”. É que durante o período dos descobrimentos o Infante D. Henrique pediu aos moradores do Porto alimentos de todo tipo, ficando a população unicamente com as tripas.

Para os portistas, como bons portuenses e habitantes do Norte, essa passagem representa mais uma referência de seu nacionalismo e patriotismo, o amor e a entrega a Portugal.

Não à toa, a torcida Super Dragões entoa nos estádios “Tripeiro eu sou /
E tenho o Porto no meu coração...”, além de puxar o grito “Quem bate palmas é tripeiro (palmas), é tripeiro (palmas), é tripeiro (palmas)”.

No que tange às torcidas, essa rivalidade pode ser verificada nos confrontos entre os Super Dragões (FC Porto) e No Name Boys (Benfica).

Em 2008, suspeita-se que integrantes dos No Name Boys incendiaram um ônibus dos Super Dragões, que havia se deslocado a Lisboa para assistirem à decisão do campeonato português de hóquei em patins. Neste mesmo dia ocorreram confrontos violentos entre as duas torcidas, após emboscada dos No Name Boys aos Super Dragões na saída de Lisboa (fala-se que, supostamente, os benfiquistas contaram com a ajuda da polícia, isto é objeto de investigação por parte do Ministério Público português).

Do lado do FC Porto, até certo tempo os Super Dragões tinham um cântico não muito pacífico em referência a Lisboa. Cantavam com orgulho, especialmente nos jogos na capital: “Nós só queremos Lisboa a arder / Lisboa a arder / Lisboa a arder / Nós só queremos Lisboa a arder / Lisboa a arder...”. Já não cantam mais, porém não se pode deixar de fazer menção à tamanha demonstração de amor e apreço pela capital do seu país.

Enfim, a título de conclusão, podemos afirmar que quando Benfica e FC Porto entram em campo para se defrontarem, pisam no gramado não apenas para uma disputa de futebol. Benfica e FC Porto levam consigo a paixão e o ódio de duas cidades e uma rivalidade quase milenar.

O Benfica, clube mais popular de Portugal, vestido de “encarnado”, representa o centralismo português; a concentração de poder na capital Lisboa; o desprezo e a arrogância lisboeta em relação ao resto do país, em especial ao povo do Norte.

O FC Porto, como bem disse o seu presidente recentemente, é "o grande baluarte do Norte, cada vez mais esquecido e amordaçado", representando, portanto, o brio e bravura do Norte, inconformado e historicamente resistente.

FC Porto x Benfica, Benfica x FC Porto, é muito mais do que um simples jogo de futebol.


Histórico de Confrontos

Em todas as competições:

Jogos – 205
Vitórias do FC Porto – 76
Vitórias do Benfica – 76
Empates – 53

Na Liga Portuguesa:

Jogos – 150
Vitórias do FC Porto – 57
Vitórias do Benfica – 52
Empates - 41

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

É este o Brasil que queremos?

Paro num sinal. E o sinal de uma sociedade desigual se faz presente. Eu em meu carro, janelas fechadas, ar-condicionado ligado. Jovens adultos, adolescentes, e crianças no lado de fora, tentando ganhar algum trocado – pedem esmolas, vendem toda a sorte de produtos (flanelas, confeitos, etc.) ou se oferecem para lavarem o para-brisas.

É dura a realidade social brasileira. Um país tão rico quanto desigual e excludente. Uma nação que por razões políticas e econômicas (falta de vontade política; ganância daqueles que detêm o poder econômico) atira para a marginalidade social imensa maioria de sua população.

O sol esquenta o dia. Enquanto uns trabalham e/ou cumprem suas obrigações, outros vão à praia aproveitar as benções da natureza. Contudo, há muitos que batalham sol a pino a fim de terem o mínimo para sobreviverem (e por mínimo de sobrevivência não se entende o mínimo necessário para viverem com dignidade e humanidade).

Até quando conviveremos com estes dois “Brasis”?

Até quando viveremos em um país que se divide e se segrega, separa uma pequena parcela incluída (usufrutuária das benesses sociais) de uma enorme parcela excluída do convívio digno e humanizado dos direitos sociais?

É o país que temos.

Mas é o país que queremos?

O que fazemos para mudar essa realidade?

Ou será que apenas contribuímos para que o fosso se aprofunde cada vez mais?

Qual é o Brasil que queremos para o (nosso) futuro?

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Segunda-feira

Pego minha caneca. Dou mais um gole. Café preto, com bastante açúcar.

Desperto-me para os afazeres do dia. Volto-me para as obrigações cotidianas.

Passo a passo. Vagarosos passos rumo à porta. Arrastados passos de quem se move sem muita empolgação, ou sem a menor vontade.

Hoje é segunda-feira. Há dia pior que a segunda-feira?

O fim de semana ficou para trás (Ah! Que fim de semana prazeroso, ao lado de alguém especial. Pena já ter chegado ao fim). Vejo-me diante de uma semana inteira pela frente. Mais uma sucessão de dias a ser vencida.

Fecho a porta. Deixo às minhas costas o conforto do lar. Espero o elevador. Torço para que esteja vazio (existe situação menos agradável do que dividir um elevador com um “estranho”? Pode haver situação tão desagradável quanto, porém mais desagradável eu duvido!).

Encontro-me na rua. O sol faz questão de mostrar toda a sua força, mesmo a esta hora tão miúda da manhã. Não há escapatória. Estamos em Recife. E Recife é assim no mês de dezembro.

Ultrapassar mais uma semana a esta altura do calendário significa que nos aproximaremos do fim do ano. Mais um ano que se vai. Mais um ano que há de vir.

O dia que passará. As 24 horas a serem transcorridas pelos ponteiros do relógio nos trarão a terça-feira.

A semana, que somente agora se inicia, já traz consigo a marca inevitável de passado; a cicatriz inexorável do tempo.

Mas hoje é apenas segunda-feira. E eu ainda tenho muito que fazer neste primeiro dia de semana (que, embora fadada ao passado, há que ser vivida pelo presente que ainda o é).