Desde o começo desta semana a população recifense e da Região Metropolitana passou a pagar mais caro pelo transporte urbano. As tarifas cobradas pelas empresas responsáveis pelo transporte público tiveram um aumento de 8.59%. Pouco mais de dois anos depois do último reajuste, ocorrido em novembro de 2005, os empresários se sentiram na necessidade “vital” de elevarem os custos do transporte.
Dois anos e dois meses depois de muitos protestos e bastante revolta dos estudantes e do povo menos favorecido, os empresários, a EMTU e o Governo do Estado nos brindam com mais um aumento. Os 8.59% propostos pela EMTU, dirigida pelo petista Dílson Peixoto, correspondem ao Índice de Preços ao Consumidor Ampliado (IPCA), de novembro de 2005 a janeiro de 2008. Porém, acreditem, os empresários queriam ainda mais, para eles o reajuste deveria ser de 28,13%. Pobres coitados, não é mesmo?
O anel A, mais utilizado (cerca de 70% dos usuários), saltou de R$ 1,60 para R$ 1,75. Os anéis B e D, também entre os mais utilizados, saltaram para R$ 2,60 e R$ 2,10, respectivamente. 70% dos usuários estão pagando RS 0,15 a mais por passagem, portanto, no mínimo R$ 0,30 por dia, que dá uma média de R$ 1.80 por semana, R$ 7,20 por mês, isso calculando que a pessoa apenas precisará de duas passagens diárias, em seis dias por semana, o que todos sabem que não corresponde à realidade social dos trabalhadores da RMR e de muitos estudantes.
As tarifas aumentam, mas será que a qualidade do transporte público também aumenta? Os empresários dizem que sem o aumento a qualidade oferecida à população irá cair, pois seus custos se elevaram, logo as passagens devem cobrir estes custos, portanto, o povo tem que pagar por isso, pois o lucro há de ser salvo. Entretanto, alguém pode me responder: de novembro de 2005 para janeiro de 2008 a qualidade do transporte público aumentou ou caiu?
Os empresários devem achar que o povo é burro e desprovido de qualquer capacidade de raciocínio e crítica. Se a desculpa dada sempre é a de manter a qualidade do produto oferecido, então, basta fazermos uma breve análise do que aconteceu nos últimos anos. A qualidade aumentou, caiu, ou, pelo menos, manteve-se no mesmo nível?
Simples: os “kombeiros” promoviam uma concorrência com as empresas “tradicionais”. Ofereciam preços mais baixos, o que atraia grande parcela da carente população do grande Recife; ofereciam linhas alternativas, que melhor serviam as pessoas. Os “kombeiros” trouxeram algo novo para os usuários de transporte coletivo da RMR, a sensação de que havia uma alternativa mais barata e eficaz.
Foi na época áurea do transporte alternativo que surgiram novas linhas do “transporte tradicional”; foi também nessa época em que surgiram os “geladinhos” e “geladões”, com ar-condicionado, e outros veículos com muito mais comodidade e conforto para os passageiros. As empresas, temendo a concorrência, foram forçadas a aumentarem seus custos, abrir mão temporariamente de parte dos seus lucros, para frear o crescimento da demanda dos transportes alternativos. A população da Grande Recife pôde vivenciar a livre concorrência e colher, daí, uma melhor estrutura, enfim, um melhor tratamento.
Porém, os empresários não estavam satisfeitos com essa situação. Se há algo que a maioria do empresariado não gosta nem de ouvir falar é redução de lucros. E os “kombeiros” incomodavam, na medida em que faziam concorrência e ofereciam uma alternativa às pessoas, os lucros das empresas iriam sofrer. E no mundo em que vivemos, as pessoas não têm vez, os seres humanos são relegados a seres inferiores, sem face, tornam-se em uma massa meramente consumidora. De cidadão a consumidor, esta é a realidade.
Chomsky lançou a pergunta: o lucro ou as pessoas? A EMTU, a Prefeitura (Popular) de Recife, o Governo do Estado e os empresários do transporte coletivo na RMR deram a reposta: o lucro. E lá se foram os “kombeiros”, em sua maioria pessoas de baixa renda, desempregadas, que tinham como única fonte de renda o trabalho honesto de motorista e cobrador do transporte alternativo. A Prefeitura (Popular) de Recife, cujo lema é “cuidar das pessoas” não pensou na imensa maioria das pessoas, no povo sofrido de baixa renda, naqueles que sofrem o cotidiano de trabalhos duros e mal pagos; da exploração do capital.
E, desde então, o transporte público sofreu uma queda vertiginosa de qualidade. Para quê investir e manter veículos de maior consumo se já não existe mais concorrência, não é verdade? Exatamente. Foi isto que fizeram, paulatinamente, os empresários da RMR. E não houve aumento de valor das passagens que fez esta queda brutal na qualidade parar. Aumento de qualidade? Isto só nos melhores sonhos utópicos de quem acredita que um dia o povo será tratado de forma humana e fraterna.
Eis que chegamos, finalmente e infelizmente, a 2008. No comando do Governo Estadual um novo grupo, saiu a coalizão de direita e entrou a de centro-esquerda. Em campanha, o atual governador prometeu redução das tarifas. Um sonho a ser realizado? Um governante que pensa nas pessoas? Ou mera promessa demagógica de campanha?
Mais uma vez, o lucro prevaleceu. E a promessa de redução do valor das tarifas não passou de palavras soltas ao vento, de propaganda eleitoral. Mais um engodo para o povo. Na prática, a mudança não existiu.
Houve novo aumento. O Governo do Estado, ao invés de cumprir sua promessa, apresentou uma proposta de 8.59%, os empresários, mesmo contrariados, aceitaram, pelo menos estarão a somar.
Aproveitaram o mês de janeiro para tomar esta decisão. Mês de férias escolares e acadêmicas, época, também, em que muita gente está pensando em praia, sombra e água fresca. Um período bastante propício para evitar grandes mobilizações populares. Quanto menos barulho, melhor para aqueles que estão no comando.
As passagens aumentaram, mas o povo continuará sofrendo com ônibus lotados, veículos desconfortáveis e em péssimo estado de conservação, frotas reduzidas e da insegurança nos coletivos, reflexo desta calamidade que assola nosso estado. Tudo isso irá continuar, e, se for mantida a tendência dos últimos anos, não apenas as passagens aumentarão, a péssima prestação de serviços também.
Se não nos levantarmos, se não nos fizermos ouvir, seremos cada vez mais ignorados, explorados e desprezados. Não podemos baixar nossas cabeças e nos conformamos. O conformismo é alimento para aqueles que querem explorar e enriquecer às custas do povo.
A união é necessária. A mobilização é essencial.
Se o lucro está acima das pessoas, o que será das pessoas?