sexta-feira, 13 de novembro de 2009
Onde eu estou?
Ele acordou com uma estranha sensação. Não sabia onde se encontrava. Não sabia quem era. Não sabia se estava vivo ou morto. Não sabia se alguma vez viveu e se aquilo que sentia era, finalmente, a libertação do vazio que sempre o tomou e o tornou um semivivo (ou semimorto?).
Acordou, olhou ao seu redor e não reconhecera absolutamente nada.
Levantou-se, dirigiu-se à porta do quarto, deparou-se com um longo corredor que parecia não ter fim. Perguntou-se onde poderia estar, como foi ali parar, quem o teria levado àquele (até então) misterioso lugar.
Em todo o corredor, até onde sua vista alcançava, ele não via uma única porta, exceto a do quarto em que se encontrava. Curioso e apreensivo, resolveu clamar por alguém – “Tem alguém aqui? Onde estou?”.
Tem alguém aqui? Onde estou?
Aqui... Estou?
Eco. Foi a resposta que obteve. A sua própria voz a ecoar na imensidão desconhecida daquele corredor (aparentemente) sem fim.
O pobre homem, cuja vida fora marcada pelo sofrimento, por todos os tipos de provação e expiação, encontrava-se isolado, solitário e perdido, completamente perdido. Sem saber onde estava. Sem saber o que o esperava. Sem saber para onde ir.
Da janela do quarto via-se um jardim sem vida. Ou melhor, via-se o espectro daquilo que um dia fora um belo e florido jardim, repleto de vida, cor e fragrância.
O corredor, estreito, de paredes que um dia foram brancas, mas hoje estavam negras de tanta sujidade, levava-o para o desconhecido. Direita ou esquerda? Qual lado seguir?
Lembrou-se, então, das aulas de catecismo e se dirigiu para o lado direito - “está sentado à direita de Deus pai” – foi pela direita que ele avançou, crente de que seguia o caminho para a sua redenção.
Ao dar dois passos, a porta do quarto se fechou. A luz fosca, que timidamente entrava pela janela e iluminava alguns poucos metros do corredor, dissipou-se.
Escuridão.
O pobre homem, calejado por uma vida dura e ingrata (segundo seu próprio entendimento), sentiu um frio na espinha. Um vertiginoso frio na espinha. De efeito amedrontador.
Aflito. Desorientado. Desamparado. O pobre homem, sem entender nada do que estava acontecendo, não sabia o que fazer. Se voltava atrás e tentava reabrir a porta do quarto. Se confiava em sua decisão e seguia (crente da melhor opção) em frente.
Resolveu manter os passos adiante. Afinal, é “pra frente que se anda”, pensou o nosso abandonado amigo.
Quando o seu corpo padecia e suas esperanças se esvaiam, após longa e interminável andada, o maltratado homem vê um fecho de luz.
Fiat Lux. Faça-se a luz. “Aquele que sentir zelo pela lei e permanecer fiel à aliança, venha e siga-me”.
Foi o que pensou o nosso inocente amigo. Renovado de esperanças – “quem espera sempre alcança”.
Seguiu, então, a luz. Fagulha de esperança.
A adrenalina lançada na corrente sanguínea pela esperança renovada o fez esquecer o medo, as dúvidas e, principalmente, o corpo fatigado.
Passos largos a caminho do fecho de luz que à sua frente se apresentava.
Uma porta. Entreaberta.
O homem abre a porta lentamente. A luz faz com que os seus olhos ardam e fique sem enxergar por alguns segundos.
Reabriu as pálpebras e deixou que a luz chegasse às suas retinas, para que pudesse levar toda aquela informação ao cérebro, e, este sim, transformasse toda aquela luminosidade em imagens.
Espanto!
Pavor!
Seu corpo estremecia horrorizado. Um suor frio escorria pelo rosto. Seu coração palpitava a mil quilômetros por hora, aquilo que chamam de taquicardia, e parecia que lhe sairia pela boca.
O pobre homem olha ao seu redor e reconhece o lugar a que chegou.
Pergunta-se por que tamanha expiação, o que fizera nesta vida ou em outra passada para merecer tamanho sofrimento.
O inocente e desamparado homem senta-se na cama. A mesma onde acordara pela manhã. Olha para o desconhecido quarto, que agora já nem é tão desconhecido quanto isso e se pergunta em um lamuriante clamor:
ONDE EU ESTOU?
"O operário de hoje trabalha todos os dias em sua vida, faz as mesmas tarefas. Esse destino não é menos absurdo, mas é trágico quando em apenas nos raros momentos ele se torna consciente" (Albert Camus).
quinta-feira, 12 de novembro de 2009
Manhã de novembro
Céu azul, sem uma nuvem a atrapalhar o seu esplendor. O sol brilha intensamente nesta manhã de novembro.
Trajo uma camiseta regata e uma bermuda beirando os joelhos, caminho pelas ruas de Boa Viagem com o sol como companhia, guiando-me ao acaso, levando-me para o não sei onde.
O suor escorre pelo rosto. O sol que ilumina e guia é o mesmo que (me) aquece (n)esta manhã recifense. E como aquece! Sol fervente... Frevente... Nesta manhã de novembro na terra do Frevo.
Ando a passos lentos, como se estivesse a me poupar para o (desconhecido) que vem adiante. A poupar energias. As minhas energias. A me alimentar da impiedosa energia solar (afinal, para algo ela há de servir, além de me encharcar em suor).
Ao suor que escorre em meu rosto misturam-se lágrimas.
São lágrimas de uma saudosa lembrança que me remete a uma outra manhã ensolarada do undécimo mês de um ano distante. Perdida no tempo. Especialmente guardada na (minha) memória.
O céu está azul e o sol resplandece de forma exuberante. Nem uma nuvem branca a manchar o celeste azul do céu.
Saio de casa trajando quilos de roupas, a proteger meu (frágil) corpo da fria manhã do outono espinhense. É que o sol que ilumina o céu de Espinho, neste mês de novembro, não é suficiente para aquecer o corpo (e a alma) dos habitantes desta pequena e pacata cidade no Norte de Portugal.
Caminho a passos largos. O frio não convida a ficar muito tempo na rua. A caminhada rápida ajuda tanto a chegar mais de pressa ao destino final, quanto a aquecer (um pouco) o corpo.
Manhã de novembro de 1994. Meu primeiro dia de aula. Ansioso. Expectante. Receoso do que está por vir. Curioso a respeito do que o futuro guarda para mim.
Os quilos de roupas que me aquecem o corpo não são suficientes (e nunca seriam, obviamente) para esconder o frio na barriga. Sou um forasteiro. Acabado de chegar. Tudo para mim é novidade. Um novo mundo, em pleno “Velho Mundo”.
Enxugo as lágrimas e o suor do rosto. Abro os olhos. Deparo-me com o Mar. De Boa Viagem? Ou será de Espinho?
Lembranças e momentos que se confundem e se misturam. Realidades passadas (e bem guardadas na memória) e presentes se fundem, tornando-se uma só. Uma só existência. Uma só pessoa: eu.
Somos o passado e o presente que se tornará o amanhã. Somos aquilo que fazemos ou deixamos de fazer. Somos “os pensamentos que pensamos, as ações que cumprimos, as lembranças que conservamos e não deixamos apagar e das quais somos o único guardião”, em suma, “somos aquilo que lembramos” (Noberto Bobbio).
Trajo uma camiseta regata e uma bermuda beirando os joelhos, caminho pelas ruas de Boa Viagem com o sol como companhia, guiando-me ao acaso, levando-me para o não sei onde.
O suor escorre pelo rosto. O sol que ilumina e guia é o mesmo que (me) aquece (n)esta manhã recifense. E como aquece! Sol fervente... Frevente... Nesta manhã de novembro na terra do Frevo.
Ando a passos lentos, como se estivesse a me poupar para o (desconhecido) que vem adiante. A poupar energias. As minhas energias. A me alimentar da impiedosa energia solar (afinal, para algo ela há de servir, além de me encharcar em suor).
Ao suor que escorre em meu rosto misturam-se lágrimas.
São lágrimas de uma saudosa lembrança que me remete a uma outra manhã ensolarada do undécimo mês de um ano distante. Perdida no tempo. Especialmente guardada na (minha) memória.
O céu está azul e o sol resplandece de forma exuberante. Nem uma nuvem branca a manchar o celeste azul do céu.
Saio de casa trajando quilos de roupas, a proteger meu (frágil) corpo da fria manhã do outono espinhense. É que o sol que ilumina o céu de Espinho, neste mês de novembro, não é suficiente para aquecer o corpo (e a alma) dos habitantes desta pequena e pacata cidade no Norte de Portugal.
Caminho a passos largos. O frio não convida a ficar muito tempo na rua. A caminhada rápida ajuda tanto a chegar mais de pressa ao destino final, quanto a aquecer (um pouco) o corpo.
Manhã de novembro de 1994. Meu primeiro dia de aula. Ansioso. Expectante. Receoso do que está por vir. Curioso a respeito do que o futuro guarda para mim.
Os quilos de roupas que me aquecem o corpo não são suficientes (e nunca seriam, obviamente) para esconder o frio na barriga. Sou um forasteiro. Acabado de chegar. Tudo para mim é novidade. Um novo mundo, em pleno “Velho Mundo”.
Enxugo as lágrimas e o suor do rosto. Abro os olhos. Deparo-me com o Mar. De Boa Viagem? Ou será de Espinho?
Lembranças e momentos que se confundem e se misturam. Realidades passadas (e bem guardadas na memória) e presentes se fundem, tornando-se uma só. Uma só existência. Uma só pessoa: eu.
Somos o passado e o presente que se tornará o amanhã. Somos aquilo que fazemos ou deixamos de fazer. Somos “os pensamentos que pensamos, as ações que cumprimos, as lembranças que conservamos e não deixamos apagar e das quais somos o único guardião”, em suma, “somos aquilo que lembramos” (Noberto Bobbio).
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